quarta-feira, 30 de novembro de 2016

A NOIVA DO DRÁCULA - CAPÍTULO 25

A Noiva do Drácula


CAPÍTULO 25


A taça é jogada ao encontro da parede, estilhaçando-se e deixando uma mancha de sangue no lugar. Havia manchas de sangue por quase todo o cômodo dando um aspecto ainda mais perturbador a toda aquela bagunça. O quarto estava quase todo destruído, o único objeto ainda intacto era o quarto de Luana.



David limpa com as costas da mão a boca ainda suja de sangue. Vestia uma blusa vermelha de manga e uma calça preta um pouco rasgada, e estava descalço. Seu rosto era de cansaço e palidez misturados com toda a raiva que sentia. Estava se sentindo sem ânimo, sem alma. Ele olha com desgosto para a pilha de bolsas de sangue no canto do quarto. O sangue era bom, mas sentia que estava faltando alguma coisa. Aquilo não conseguia satisfazê-lo nem ao seu paladar. Ficava se perguntando como seria o gosto do sangue de Luana. Nunca havia experimentado, é claro. Mas apenas o cheiro o deixara maluco e sedento por morder aquele pescoço delicado e saber o quão maravilhoso era o sangue dela. Queria cravar os dentes caninos naquele pescoço pulsante e delicioso, fazendo-a se derreter em seus braços enquanto a fazia mulher. David ri e se agacha encostado na cama quebrada. Sabia que esse dia iria chegar, pois faria de tudo para separar Luana e Alan.
David apóia a cabeça entre os joelhos respirando pesadamente.
– Que vida de merda. – Diz derrotado. – Que vida de merda.
Lentamente ele olha para o rosto no quadro pendurado na parede.
– Jamais deixarei vocês ficarem juntos. Seu lugar não é ao lado dele, mas do meu.
David pega mais uma bolsa de sangue que está ao lado e a abre.



– Sabe, meu amor, foi horrível ter que me demitir do trabalho, mas nunca poderia sair no sol, pois agora você já sabe que eu sou um monstro. É, você não entendeu errado. Eu sou um monstro.
Ele bebe três goles do sangue, fazendo cara feia.
– Isso aqui é uma porcaria. – ele diz apontando com desgosto para a bolsa ainda cheia de sangue. – Isso não é digno do meu paladar super aguçado. Só o seu. Mas estou tão faminto que vou ter que me saciar disso por enquanto.
Alguém bate a porta.
– Quem é? – David pergunta contrariado.
– Sou eu. Ivan.
David suspira irritado.
– O que você quer?
– Posso entrar? – Ivan fala com a voz suave.
David emudece. Desde que migraram para o Brasil não conseguia mais dividir os espaços com seus tios, e nem mesmo os deixava invadir o seu. Sentia-se melhor sozinho, e não com dois vampiros arrogantes que fingiam se preocupar com seus problemas.
– Fala logo o que você quer. – Resmunga autoritário.
– David, não posso falar com a porta. – Ivan diz.
Após uma pausa e um longo suspiro, David se levanta e abre a porta. Ivan entra e na hora se espanta com o que havia no quarto; estava tudo destruído, e marcas de sangue em todos os cantos das paredes. Além de ter um quadro enorme de Luana.
– O que está olhando? – David pergunta amuado.
– Você... Você acabou com o quarto. – Ivan diz ainda encarando toda aquela bagunça. – E há um quadro de Luana aqui... – Ivan chega mais perto admirado com a beleza daquele quadro.
David o encara irritado.
– Se veio aqui somente para isso, sugiro que saia.
Ivan olha para ele.
– Não, David. Queria saber se você está bem. Vi você sair hoje de manhã e fiquei preocupado. Se machucou?
David abranda sua expressão e olha impassível para Ivan.
– Não, não me machuquei. Tomei medidas necessárias para isso, mesmo com esse calor infernal. Mas tinha que sair, pois tinha algo importante a fazer.
– E o que era?
David cruza os braços, com desconfiança.
– Por que a pergunta?
Ivan sorri.
– Apenas curiosidade.
– Curiosidade? – David estreita os olhos. – Ou está tentando zombar de mim?
– David, não diga isso. Apenas me preocupei com você. Queria saber como você está.
David descruza os braços e passa uma das mãos pelo cabelo.
– Ok. Mas o que você quer, de verdade? Quer ver se eu tenho algum hematoma depois daquele episodio na sala de estar com Alan? Veio se vangloriar pelo seu irmão? – David fala alterando a voz.
Ivan o encara consternado.
– David, por favor, não diga essas coisas. Você sabe que não é verdade.
David ri.
– Eu sei que não é verdade? Eu sei? Não, Ivan. O que eu sei é que minha vida está virando mais que  um inferno, e não tem ninguém para me ajudar. –  David o encara nervoso. –  Vocês fingem se preocupar comigo, mas um já roubou a mulher que eu amo. E você? O que vai fazer? –  ele rosna, mal podendo se controlar.
Ivan balança a cabeça, derrotado. Sabia que não podia tentar ter uma conversa decente com David naquele estado. Seu sobrinho era pura fúria mal contida, e aquilo lhe soava muito familiar.
Ele suspira pesadamente.
– Tudo bem, David. Deixarei você em paz.
– Não se preocupe, Ivan. Para divertimento de vocês, vampiros, paz é uma palavra que eu não conheço.
David repara que Ivan o olha com pena. Só em ver aquela expressão ele sentia ainda mais raiva. Não queria a maldita pena de ninguém, muito menos deles.



– Pode sair do meu quarto, por favor? – David fala tentando manter o mínimo de controle possível.
– Tudo bem. – Ivan abre a porta. – Mas, por mais que você não se importe, quero que você descanse. Não pode ficar acordado dia e noite, David.
David suspira.
– O que eu posso fazer? Não consigo mais dormir a noite. E dormir de dia seria assumir para mim mesmo que sou igual a vocês. – ele fala secamente.
Ivan o olha confuso.
– Mas você é igual a nós, David. Você é um vampiro.
David ri. Aquela era a gota d’água. Como ele ousava falar sobre igualdade agora quando a algum tempo atrás tinha a mesma forma de pensar que a Elite? Ele era igual a todos eles. David fecha a cara no mesmo instante e aponta com fúria para a saída.
– Vá embora daqui. – ele rosna.
– David... – Ivan insiste.
– VÁ EMBORA! – David altera a voz, os olhos azuis fuzilando os de Ivan.
Dando um longo suspiro, Ivan ajeita a compostura e ergue a cabeça, orgulhoso.
– Como queira.
Dando uma pequena olhada para o quadro de Luana, ele caminha em direção a porta. David percebe para onde ele olhou, fazendo-o ficar ainda mais nervoso. Ele olha de soslaio Ivan passando pela porta, tentando defender o mínimo de orgulho que tinha. Todos os vampiros eram muito orgulhosos, mas havia algo em Ivan que era diferente. Algo mais humano. 



David fecha a porta. O que Ivan dissera antes o havia perturbado muito. A exatamente quatorze anos ele o menosprezara na frente de toda a Elite e de outros vampiros. Ele e Alan e haviam tratado como nada na frente de todos os presentes na festa, fazendo-o perder qualquer esperança do que significava ser “família”. A partir daquele momento tomara ódio de tudo e de todos, incluindo os vampiros. Nada seria como antes em sua vida. Principalmente depois de Luana.
Luana...
Ele olha para o retrato dela, absorvendo aquela beleza única. Luana mudara sua vida para melhor e para pior. Simplesmente, ela era o motivo de sua raiva e sua calma. Sentia-se perdido com ela e sem ela. E não a perderia como perdera sua família. Não, nunca. Lutaria por ela até o fim, mesmo que isso significasse perder sua vida.

* * *

Luana finalmente chega em casa.
Havia chegado em casa uma hora atrasada pois tinha saído para uma lanchonete com os amigos, logo depois do trabalho. Apesar de seus temores, sentia-se feliz de ver que seus amigos ainda gostavam dela. A verdade é que eles sempre estariam lá quando precisasse, mas os acontecimentos em sua vida estavam tão grandes que sentia tudo desabaria. Nina estava mais gentil que antes, mas sabia que, no fundo, havia uma palpável rivalidade ali. Só não entendia por que ela a enxergava como uma ameaça no que sentia por David, sendo que nunca esteve apaixonada por ele. Mas, conseqüentemente, David estaria ainda mais em sua vida a partir de agora.
Após dar um breve beijo de boa noite em sua madrinha, Luana entra em seu quarto e larga a bolsa em cima da cama. Apesar do dia ter terminado em algo bom, ainda estava muito tensa por causa do conteúdo daquela carta. Aquilo a havia deixado muito assustada, e queria muito entender o que tinha passado pela cabeça de David quando ele escrevera. Amor não era. Não. Não conseguia imaginar um homem apaixonado escrevendo aquele tipo de coisa para a mulher amada. Mas David não era um homem comum, ele era um vampiro. Vampiros não tinham emoções como os humanos, até onde sabia.
Será que é por causa dessas emoções vampiras que ele está ficando louco?
Luana encara seu reflexo no espelho. Se perguntava bastante por que Alan e David gostavam dela. Claro que sua auto-estima era boa, se achava bem bonita. Mas não entendia por que exatamente dois vampiros tinham mostrado tanto interesse.
Ela respira pesadamente.
- Ah, David... Eu queria poder te entender.



Luana se vira para pegar sua bolsa, mas dá um passo para trás arregalando os olhos ao ver a figura alta e imponente parada a sua frente.
– David! – ela diz sem fôlego e rapidamente olha para o espelho do guarda-roupa, vendo que não havia ninguém ali, exceto ela. Ela volta a olhar para ele com confusão e espanto.   
– Como pode ver, parece que já perdi meu reflexo. – ele sorri. – Como vai, Luana?     
Ela engole em seco ainda absorvendo a presença dele. E ele estava tão perto...
– O que está fazendo aqui, David?
Ele chega um pouco mais perto e a olha nos olhos, fazendo-a se hipnotizar com aqueles azuis profundos.



– Queria ver você. – ele sussurra.
Ela dá um passo para traz, tentando manter um pouco de distância.
– Por que escreveu aquilo?
David fica um pouco mais sério e a analisa brevemente. Estaria ele lendo sua mente?
– Eu a assustei?
– Sim. – ela sussurra. – Muito.
– Essa foi a intenção.
Luana o encara pasma. Como ele podia dizer aquilo?
– O que...
– Eu amo você. – ele diz de repente, fazendo-a suspirar. – E saiba que eu não vou desistir. Tudo que escrevi naquela carta é para você saber que pertence apenas a mim.
– David, você está ficando louco. – ela diz perturbada com a frieza dele.
– Talvez eu esteja. – ele pega uma mecha solta do cabelo dela e acaricia com reverência. – Mas estaria mesmo louco se deixasse você ficar com ele.
– David, eu o amo...
– Você não o ama! – ele rosna, fazendo ela dar um pulo. – Merda, você não o ama.
– E como você pode saber? – ela ajeita a mecha de cabelo para trás da orelha, nervosa. – Você não sabe nada sobre meus sentimentos! Por acaso lê minha mente?
Ele sorri, aliviando a expressão.
– Ainda não tenho esse dom. Mas não se preocupe. Mesmo que eu tenha, não usarei contra você.
Luana o encara, indignada.
– Como pode ser tão frio?
– Não, Luana. A pergunta é: como você pode ser tão fria? Como pode não ligar para os meus sentimentos? Fingir que eu não existo e achar que tudo que eu sinto por você é algo a ser jogado fora. – ele a encara com os olhos ardentes de raiva. – Até quando vai fugir de mim, Luana?
Ela tenta manter a respiração calma, apesar de que já sentia as pernas bambas por causa daquele olhar.
– Eu não finjo que você existe, David. Você é meu melhor amigo, até antes dos outros. E a questão aqui não é eu ligar para os seus sentimentos. Eu ligo, acredite. Mas a questão que você tem que entender é que Drá... – ela se corrige rapidamente, sabendo que o nome de seu nome era outro. – Que Alan e eu nos amamos.
David a encara pasmo pelo que parece ser uma eternidade, mas depois ri, mordendo o lábio inferior. Contudo, podia sentir a raiva escondida naquele sorriso. Ele parecia querer se controlar. Talvez não quisesse assustá-la mais do que já a assustara até agora.
Ele a encara, os olhos pegando fogo. O sorriso tinha sumido.
– Ele te ama? Deixe eu lhe contar um segredinho, Luana. – Ele fala entre dentes. – Vampiros não têm sentimentos. Eles não amam ninguém. Não fique achando que há um conto de fadas nesse mundo sombrio, porque isso não existe. Eu amo você, e não vou desistir de te ter para mim por nada desse mundo. E um dos maiores motivos de nunca querer que você fique com esse maldito é que eu sei que ele só quer você para tirar sua virgindade e arrancar o sangue do seu lindo pescoço. – ele rosna.
Luana o encara com os olhos embaçados pelas lágrimas. Estava com uma terrível vontade de chorar.
– então, você se enquadra nisso, não é? – ela rebate. – Porque você também é um vampiro.
Ele faz uma breve pausa.
– Não, Luana. Não sou um vampiro completo, ainda tenho alma humana. E, como os humanos, aprendi a ter sentimentos.
– Por que está fazendo isso comigo? – ela pergunta com a voz embargada. Estava tentando controlar suas emoções ao máximo para não chorar na frente dele.
– Porque meu amor por você é maior que qualquer outra coisa nesse mundo, e quero que saiba que vou continuar atrás de você.
Luana tenta acalmar a respiração pesada e o encara, perdida. David não desistiria. Falar com ele era como falar com uma criança teimosa.
Ela o olha atentamente. Agora havia notado que ele estava completamente diferente do David que conhecia. Antes ele era estiloso e sensual, ainda que um pouco sombrio. Agora estava descalço, com uma calça preta rasgada, uma blusa vermelha larga demais, e um blazer preto e comprido com pequenas manchas vermelhas nele. O que seria? Seu cabelo estava mais bagunçado e parecia estar dois centímetros maior. Mas o que mais se destacava era seu rosto; estava tão pálido quanto cera e seus olhos estavam cobertos de olheiras fundas, parecendo que não havia dormido por um longo tempo.
O que está acontecendo com você, David?
Num impulso, ela levanta lentamente o braço direito em direção ao rosto másculo, porém pálido. David, percebendo o que ela está prestes a fazer, pega a mão delicada e feminina e acaricia o rosto na mão dela, com reverência. Ele a amava. Agora sabia que ele a amava de verdade, apenas não conseguia controlar seus sentimentos. Luana vê, um pouco maravilhada e perturbada com a situação, David beijando lentamente seus dedos e sua mão. Ele mais parecia um apaixonado desesperado fazendo aquilo. Entretanto, tinha que pará-lo já. Por mais que ele a amasse, não podia dar falsas esperanças a ele. Ela não o amava.
– David, pare.
Ela puxa sua mão, mas ele consegue segurar. Ele era bem forte.
David para por um segundo, encarando a mão dela. Seu rosto era de perturbação e algo mais que não sabia explicar. Estava horrorizado, e seus olhos brilhavam. Num ímpeto, ele solta sua mão e se vira em direção a porta do quarto.
Ela o encara sem entender.
– David?
Ele abre a porta sem encará-la.
– Foi bom te ver, Luana. Mas tenho que ir agora, antes que eu faça uma besteira. – ele diz com a voz grave e rouca e logo sai.
Luana olha para o quarto vazio tentando entender o que realmente tinha acontecido ali. Em um momento ele insistira em ficar perto, já em outro ele fugira como se estivesse perturbado com algo. Luana vira sua mão direita e vê que em seu dedo anelar havia sangue.                                                                                 

 


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